CASTELO ONDE TE SONHO POESIA

CASTELO ONDE TE SONHO POESIA

sábado, 9 de agosto de 2014

POEMA: Fonte de beber*




















FONTE DE BEBER, por PjCondePaulino
*
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Ao luar: embriaguei-me ao beber o mar
E pensei que o mundo era eu por te amar.

Soube depois: tu és o universo
Eu: o olhar das estrelas onde viajo
E viajo, entre os planetas da saudade
No mundo perfeito da intimidade.

Ainda faço das mãos a concha de beber
Ainda bebo da fonte dos risos ao entardecer

Ainda sou eu, nas pedras junto ao Tejo
Quando o mar se enamora no teu beijo.
E as ondas, batem na areia prateada
Como quem tem tudo e não quer nada.

Lembras-te da fonte de água doce?
Pequena, nos pedregais e logo ali:o mar...
Era perfeita e ainda que não fosse
Tu és a fonte de beber...De me encantar!

*

*
-In Castelo de Palavras e Sentimentos-POEMA.

sexta-feira, 8 de agosto de 2014


Continuação de:
MANIÉRE ARGUTIEUSE, por PjConde-Paulino

O Tsunami é teu amigo...O Tsunami foi amigo da tua família...Mortas? Tu é que morreste, pelo egoísmo patético dos teus actos... Perdeste a noção da verdadeira riqueza e das prioridades...”Como dizes: Rico sou, e estou enriquecido, e de nada tenho falta? Não sabes que és um desgraçado, e miserável, e pobre, e cego, e nu;” Apoc 3:17


                                                TSUNAMI

                                                                             V

Eduardo foi fruto de um casamento disfuncional. O pai viveu só para os negócios, longe da família. A mãe foi uma mulher só, com muitas carências emocionais; acabou por falecer com trinta e cinco anos, num centro psiquiátrico, depois do marido lhe ter pedido o divórcio para casar com uma mulher mais nova, americana: herdeira de grande fortuna. Eduardo sobreviveu a tudo isto, tornando -se um excelente aluno e um ótimo economista, dedicando-se de corpo e alma ao mundo dos negócios.

Apaixonou-se à sua maneira. Casou. Foi pai de uma menina lindíssima. Sentia-se realizado com uma vaidade incontrolável. Sem notar, foi ficando uma cópia do pai, obcecado pelo mundo financeiro, relegando completamente, o casamento para segundo plano, apesar de ser apaixonado pela Isabel e pela Constança, a filha.

Havia nele uma força estranha. Tinha o fulgor da determinação para vencer na vida profissional. Mas como um fragor de ferrolhos em ferro, era dominado pela força da fraqueza sentimental: era incapaz de se entregar emocionalmente. Dizia que vivia dentro dele um demónio antigo que o impedia de ser feliz dentro de sua casa. Já tinha sido assim com o seu avô paterno, com o pai; era uma herança perante a qual não podia fazer nada. Chegou a passar semanas, sem aparecer. Depois aparecia e prometia fazer diferente; não fazia. Isabel cansou-se daquela vida; estava a morrer por dentro. A Constança, pouco a pouco ficou com raiva do pai, pela forma egoísta como ele era distante e frio.

Quando chegou vinha com um ar comprometido. Na mão trazia dois bilhetes de avião, para a Indonésia. Sorriu e disse: « O meu presente de Natal, para as duas. Sei que é um sonho de família passar-mos um tempo juntos nesses lugares apaziguadores...Mas, não posso ir, surgiram compromissos.» Isabel e Constança olharam-se cúmplices e tristes; era uma cena repetida não havia nada a fazer. Ele tinha o dom das afastar, por muito que se amassem. Era doentia, esta contradição. Partiram na semana seguinte ao encontro do desconhecido.

O tsunami da Indonésia ocorreu às 00:58:53 UTC, de 26 de dezembro de 2004. A Isabel e a Constança estavam num hotel na costa oeste de Sumatra, epicentro do terramoto submarino. Eduardo tentou todos os meios para as encontrar. Gastou fortunas com investigadores. Viajou mais de seis meses na esperança das encontrar. Finalmente foram dadas como: definitivamente desaparecidas, após intensas e variadas investigações. Passaram 7 anos. Mortas. Eduardo sentia-se o mais miserável dos homens. Culpava-se sem dó nem piedade. Fustigava a alma insaciável. Não queria ser ele. Mas era humano: não tinha o poder de alterar o passado. O que fazer com o futuro?
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A verdade é que, neste momento, ele viu dois homens iguais, nos jardins de Belém, junto ao rio Tejo, dentro da crisálida invisível, de mãos dadas: o rico e o pobre como se fossem um só homem. Estenderam as mãos para tocar os pés da Terceira Pessoa, conforme a ordem mansa e suave da menina de cabelos de ouro, pele ebúrnea e olhos cor do céu azul de Lisboa; ela sorriu, tocou na crisálida invisível e falou sem abrir a boca para os dois homens aparentemente siameses: «Está na hora da transformação. Tens que nascer de novo pois os dois são um só. Olha no olhar do outro: estende as mãos e toca nas marcas dos pés da Pessoa que dorme no banco ao vosso lado. Tens que nascer outra vez... Eduardo...»




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terça-feira, 5 de agosto de 2014

Continuação de:
MANIÉRE ARGUTIEUSE, por PjConde-Paulino
Senhor, quando te vimos faminto, com sede, forasteiro, nu, enfermo, ou preso, e não te servimos?
Então o Rei responderá: Em verdade vos digo que, quando o deixastes de fazer a um destes pequeninos, a mim o deixastes de fazer
. Mateus 25:44-45



A TERCEIRA PESSOA

IV

As manifestações junto ao rio desembocando no Jardim da Praça do Império da bela Lisboa, sucediam-se naquele principio de verão. As pessoas andavam agastadas, descontentes com os políticos, com o mundo da finança, com os baixos salários, com a falta de emprego, com a mulher com o marido e a sogra. Acusavam os partidários rivais de serem más pessoas com falta de solidariedade para com os mais pequenos: os pobres, os doentes, os alienados da sociedade. Palavras de ordem por todos os lados. No entanto, os pobres, os coxos, os doentes, os velhos, os sem-abrigo, estavam ali mesmo, e ninguém era capaz de oferecer um abraço ou um sorriso amigo; ou, pelo menos, uma moeda nas mãos de quem nada tem além do velho e fiel cão sarnento, presente em cada noite de frio e naqueles dias quentes de fome.
 
Em contraponto, depois da turbulenta e brutal convulsão entre os elementos do universo interior, sentados no banco do jardim, os dois homens: o rico e o pobre, aparentemente siameses, estavam dentro duma cápsula invisível, como uma crisálida pura e protetora, cabalmente isolados do resto do mundo.
 
Outro mendigo chegou, descalço, com marcas nos pés; caminhava como se os seus pés não tocassem a relva mal cortada. Discretamente, pousou a sua mochila, gasta e já sem cor, no banco ao lado, debaixo da oliveira centenária; há quem diga que foi trazida de Belém da Galileia irmanando a Belém de Lisboa. O que sabemos é que a Terceira Pessoa pousou a cabeça na mochila e descansou sobre o banco, apesar da tempestade provocada pelo movimento contestatário da multidão de moabitas em desalinho, fustigadas pelas ondas do mar -morto de miséria humana. Entre a crisálida e o banco da Terceira Pessoa, existia um espaço muito curto: bastavam estender as mãos e podiam tocar nos pés daquela Pessoa que dormia numa paz profunda.
 
Subitamente surgiu do meio dos vários grupos contestatários a menina de cabelos de ouro, pele ebúrnea e olhos cor do céu azul de Lisboa; sorriu, tocou na crisálida invisível e falou sem abrir a boca para os dois homens aparentemente siameses: «Está na hora da transformação. Tem que nascer de novo pois os dois são um só. Olhem no olhar do outro: estendam as mãos e toquem nas marcas dos pregos da Pessoa que dorme no banco ao vosso lado.»
 
A Terceira Pessoa despertou a sorrir. O grupo das crianças passou por perto; um menino sentou-se ao lado da mochila sem cor e disse: «Sabes uma coisa? A minha avó tem uma "fotugafia" tua num quadro. Ela fala com a tua fotografia e conta-me histórias; queres contar-me uma história?» A mãe do menino ao vê-lo sentado ao lado do mendigo correu aflita e, puxando-o pelo braço, desapareceu entre as primeiras casas antes dos Pastéis de Belém.
 

To be Continued »»

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Continuação de:
MANIÉRE ARGUTIEUSE, por PjConde-Paulino

Como dizes: Rico sou, e estou enriquecido, e de nada tenho falta; e não sabes que és um desgraçado, e miserável, e pobre, e cego, e nu; Apocalipse 3:17


 O REI MENDIGO
 
III

Efetivamente, depois de caminhar mais de mil e quinhentos metros, sentou-se num dos bancos do jardim de Belém, depois de ter passado pelo Jerónimos. A angustia povoara-lhe o pensamento sobrecarregado pela indefinição interior. Perdera os seus bens mais preciosos: a sua família. Era o rico mais pobre do universo. O seu olhar deteve-se num mendigo que se aproximara com um saco verde-sujo na mão direita e uma caixa de sapatos na outra. Ainda fez menção de se erguer e sair dali apressado; todavia uma força maior forçou-o a ficar quieto. Morava no homem que se aproximara alguma coisa que o incomodava. Não, não seria o seu aspecto maltrapilho. Não. Era algo mais profundo e indecifrável. Como se nele encarnasse o único que o podia acusar dos seus defeitos, e revelar o seu passado feito de muitos expedientes interesseiros. Sabia que, nesse momento, nem a sua “maniére argutieuse” lhe poderia valer. Na presença daquele sem-abrigo sentia-se nu e o mais miserável dos homens.

A pessoa chegou e sentou-se no lado disponível do banco do jardim, sem o olhar. Ele, que era sempre corajoso e "sem papas-na-língua”, não conseguia articular palavras como se estivesse perante o monarca mais importante do universo. No entanto estava na presença de um alienado, miserável, roto e mal cheiroso. Olhou-o pelo canto do olho: a sua postura era aristocrática e, de algum modo familiar, demasiado familiar. Viu um pequeno papel, dobrado e sovado, nas mãos do homem. Igual ao que ele tinha no bolso das calças. Ia jurar que era o mesmo. Meteu a mão esquerda no bolso e tirou o pequeno papel: exatamente igual; com as mesmas dobras: com a impressão digital cor de terra e suor num dos lados. Não era igual, não era uma cópia fiel, não. O mesmo papel estava, ao mesmo tempo, na mão do mendigo e na mão dele.

O Pedinte olhou para ele, sentiu-lhe o peso do olhar, respirou profundamente, arranjou coragem e viu pela primeira vez os olhos do Mendigo. O seu corpo estremeceu, a alma queria fugir e gemeu confusa, triturada pela surpresa da visão. Pensou: «Enlouqueci; perdi o juízo; isto não está a acontecer; não, não é possivel; devo estar a sonhar».



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