CASTELO ONDE TE SONHO POESIA

CASTELO ONDE TE SONHO POESIA

terça-feira, 16 de setembro de 2014

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O PELO-DE-NEVE -. Conto de PjConde-Paulino.
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Era uma vez...Um cão de pelo branco com nuvens amarelas, num dia de chuva, perdido na rua dos gatos. No quintal do Zé da Prosa havia muitos gatos. Gatos brancos, pretos, cinzentos e uma gata amarela, bonita: a Malhadinha. O talhante da aldeia gostava de ver os gatos aristocráticos. Mas, naquela manhã de chuva, apareceu o Pelo-de-Neve. Pensou: «Este território é dos gatos; que cão será este, tão corajoso? Vou buscar a espingarda velha para o expulsar da nossa terra». - O Pelo-de-Neve escutou o pensamento do Zé da Prosa e fugiu.

 O talhante pensava alto; tão alto que os peixes do poço-frio sabiam o seu pensamento, antes de baixar o garrafão de vinho branco com uma corda, até às águas transparentes e frias do poço: o frigorifico daquela rua, e da outra também.

O Quincas gostava dos animais. Falava com eles, enquanto lhe passava as mãos no pelo. Os gatos gostavam do Quincas e ronronavam à volta das suas pernas. O Quincas era alto, para os gatos. Para os outros meninos não era alto, era normal; um rapaz como os outros.

Naquela manhã a chuva caía miudinha sobre as couves, as alfaces e nas folhas do limoeiro da horta do Ti `Rato. O Quincas gostava da chuva quente de Setembro. As aulas só começavam em Outubro. Escutou uns passos apressados, diferentes:«Aqueles passos não são de gatos». Segurou a respiração. Espreitou entre as tábuas do portão do quintal de sua casa. Não viu nada. «Estarei com alucinações auditivas»? Um vento forte veio do lado do ribeiro da amendoeira e fez cair um feixe de lenha do bardo do quintal. Ali estava ele. Olhou o Quincas. Baixou os olhos de cachorro perdido; meteu a cauda branca com pequenas nuvens amarelas entre as pernas e ladrou baixinho, quando sentiu a “festinha” no dorso molhado.

Quincas ficou muito feliz. Tinha um novo amigo. Mas, a mãe não queria animais lá em casa; a não ser a gata-Malhadinha, que era da família, desde que nasceu.

O leite das duas cabras para fazer os queijos, começou a desaparecer da grande panela de esmalte. A mãe andava desconfiada. O Quincas alimentava secretamente o Pelo-de-Neve com sopas de leite. Uma noite o irmão mais velho do Quincas sentiu um cheiro estranho no quarto onde dormiam os dois: «Que cheiro é este? Cheiras mal dos pés. Vai lavar esses pés malcheirosos; ou então, vais dormir na cabana com as cabras». Antes de acabar a frase, o mano viu uma cauda branca com pequenas nuvens amarelas a abanar, ao lado da cama. Era o Pelo-de-Neve. E agora?

A irmã dos rapazes: a do meio, entrou no quarto e gritou:
- Mãeee eles tem um cão no quarto.
- Caaala-te queres que o bicho te morda? - disse-lhe o irmão mais velho, num sussurro.
- Vocês não sabem que é proibido ter animais no quarto?
- Sim, mas este é um cão mágico, - inventou o Quincas - tem poderes especiais.
- Mentiroso, não tem nada. - resfolegou a menina.
- Está bem, mas olha, vamos os três guardar segredo; é o nosso segredo,- disse o mano mais velho. Ela concordou: Concordaram os três.

Os pais acharam estranho aqueles segredinhos suspeitos.
- Aqui há marosca. - disse o pai, naquela tarde de sábado - tão amiguinhos, os três, ao mesmo tempo? Hum....O que achas disso minha esposa?
- Eles pensam que me enganam. Anda aí um cão abandonado pelos caçadores. E tu já sabes como é o Quincas. Ontem, quando estava a varrer o chão do corredor, vi uns pelos de cão branco, fui varrendo e, dentro do quarto havia um cheiro a cão. Ainda pensei: mas estes meninos agora não se lavam? Depois vi o animal a rondar o quintal do Zé da Prosa. Fiz contas: dois e dois são quatro. Marido, queres tirar a prova dos nove?
- Quero, quero, estou muito curioso.
- Oh “Zinha, vem falar com a mãe.- chamou a progenitora.
- Não posso, mãe: estou a falar com eles.
- Mau, mas quem é aqui a mãe? Eu ou tu?
- Oh, eles não me deixam ir...
- Xii, tão pantomineira. - vociferou atrapalhado, o Quincas.
- Mãe, - falou o mais velho - temos um assunto para falar com o pai e com a mãe.

O pai sentou-se na pedra que dividia a estrada, da horta do vizinho. A mãe sentou-se na pedra seguinte. As crianças aproximaram-se como se fossem uma companhia militar: lado a lado. O Quincas sentindo-se responsável deu um passo em frente e começou por dizer:
- Bem, é assim...Tenho um cão.
- Tens um cão, de loiça? - Indagou o pai como se não soubesse.
- Não, um cão de verdade, mesmo...mas não é um cão normal, é...o mais inteligente do mundo. Pai, mãe, vão ver que vão gostar muito dele. - A mãe fez uma cara muito séria e disse-lhes:
- Mas os meninos não sabem que não quero animais cá em casa? Quem vos deu permissão para trazerem um, sem a nossa autorização?
- Oh mãe, mas ele é tão bonito, tão espertinho - arriscou a menina - Prometemos que lhe damos banho. O mano vai ao médico dos animais com ele. O Quincas dá-lhe a comidinha...

O pai sentia tanta vontade de rir perante a representação sincera das crianças. Mas lei é lei. E, lá em casa, existia esse principio desde que o Quincas e os irmãos se esqueceram de dar água aos gatinhos da vizinha Maria Jacinta quando ela e o marido foram de férias. Os gatinhos faleceram com sede.

No dia seguinte a mãe levantou-se cedo. Foi colher uvas com a comadre Rosa, na pequena vinha herdada dos avós. Inesperadamente surge um cão vadio: enorme, esfomeado e feio, a rosnar com raiva. As duas mulheres tentaram afugentá-lo com paus e pedras; pior: ficou mais enraivecido. Precipitou-se furioso, contra as duas comadres, apavoradas.

Milagrosamente surge o Pelo-de-Neve, sobre a cabeça da fera enraivecida, ferrando-lhe os dentes no pescoço. Quase ao mesmo tempo a gata-Malhadinha e os seus amigos, cravaram as unhas afiadas na cauda, no dorso e nos calcanhares do monstro de quatro patas. No meio desta luta titânica as mulheres refizeram-se do susto e conseguiram expulsar o animal medonho. Saíram dali muito agradecidas aos gatos aristocráticos e ao...O Pelo-de-Neve tinha desaparecido. Viram o rasto das suas pegadas coloridas de sangue. Desapareceu no mato; estava ferido...

O trio de irmãos assim que soube do sucedido, partiu apressadamente, na direção das vinhas. Depois de percorrerem muitos terrenos bravios e os de cultivo, o Quincas parou e disse: « Já sei onde está o Pelo-de-Neve. Está no pego da pedra na ribeira da Caridade. Os irmão olharam para ele, deram-lhe uma palmada nas costas e disseram em coro:« Vamos lá». Foram, e encontraram o amigo lambendo as feridas junto das águas cristalinas sobre os seixos polidos.

O Pelo-de-Neve viveu em casa dos nossos amigos o resto da sua vida. Ah, e foi o companheiro predileto da mãe do Quincas nos dias em que se levantava cedo para trabalhar nos campos. O lema lá de casa ficou até aos dias de hoje:« Os amigos são preciosos tesouros, guardados no coração das nossas casas; e podem ser aristocráticos, ricos, pobres mendigos, de todas as cores e raças!»

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*Conto de- PjConde-Paulino- inspirado na vida real-